Olá!

Aqui você encontra vários tipos de textos com reflexões, introspecções, filosofadas e relatos, tudo sob a luz do mosaico. Desejo inspirar você com a mesma arte que me inspira.

A luminária e a dúvida.

 Herdei vária peças de vidro do acervo da prima florista. Algumas delas, pelo seu formato, me remeteram ao passado. Revisitei mentalmente a época em que comecei a explorar os vidros translúcidos e transparentes. Lembrei do encanto e da vontade de viver dentro de um vitral.

 Escolhi um bowl para, fazendo uma luminária, transportar o passado para o presente. Quando já tinha passado da metade reconheci que estada muito desconfortável com o caminho que estava seguindo. Nem lá, nem cá. Como seria diferente? O passado não volta. Sabemos disso, mas ainda assim nutrimos uma expectativa de reviver o que foi bom. Uma insistência que conduz à frustração.

 Devidamente frustrada fiz algo que só faço no crochê: desmanchei tudo. Desfazer a luminária macambúzia trouxe alívio. Prometi para mim que isso é algo que vou repetir sempre que este desconforto surgir. Não tem tempo e material gastos que compensem olhar para alguma coisa e pensar que poderia ter sido diferente.

 Recomecei com novos cuidados, dentro de uma estética que vou chamar de atual considerando os últimos trabalhos que tenho feito. Tudo fluiu mais em paz, com algumas concessões porque sou humana.

De um lado.

De outro.

De cabeça para baixo.

Pelo lado de dentro.


À luz do sol.


À luz da vela.


 Ela é fofinha, coloridinha e traz uma sensação boa de aconchego, maaaaaaassss...fiquei me perguntando se esse visual não está começando a ficar no passado. Eu não tenho a resposta ainda. Há um bom tempo não fazia luminárias. Talvez o estranhamento faça parte desta retomada. Eu não sei e acredito que só vá saber se seguir fazendo. A gente só consegue ver uma mudança claramente depois que ela aconteceu. Durante o processo as coisas parecem incertas. Existe a dor pelo que já não é e o medo pelo que ainda será.
Até a próxima incerteza!
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A tristeza, a garrafa e o recomeço.

Dia 15 de setembro de 2023 deixei a "vida-não vida" para trás. A ansiedade batendo recordes. Chegamos dia 16, todos vivos e a salvo. Alívio.

Dia 30 de setembro de 2023 um reencontro aguardado transformou-se em despedida. Nos meses seguintes tentei equilibrar a readaptação do retorno com a readaptação da vida com um afeto a menos e um vazio a mais.

Dia 30 de novembro de 2023 uma nova despedida. Brutal. Esmagadora. Perco o chão e a companhia mais fiel que já conheci. Não há respostas para minhas perguntas. Estou também eu morta. Morta e culpada.

Dia 03 de janeiro de 2024 meus olhos (e todos os meus sentidos) encontram a cena mais triste que já testemunhei. Choque. Trauma. A tristeza vira um poço muito profundo e nesse momento eu duvidei que conseguisse refazer a minha vida. Duvidei que fosse possível criar novamente. A vida virou um lugar terrível na expectativa do próximo luto. Medo constante de trilhar os conhecidos passos de um novo funeral. As perguntas sem respostas tecem um manto de desconsolo que arrasto pelo chão.

Num dia reúno a energia para tentar. Meu olhar, que só consegue se fixar bem abaixo da linha do horizonte, vê as garrafas na prateleira mais baixa. Passo a mão por várias até escolher uma. Não lembro onde estão os puxadores de gaveta. Tudo foi organizado por mim, mas ainda não estou ali. Por fim encontro-os. Escolho um. Mais alguns dias passam com a garrafa e o puxador sobre a mesa. Ainda parece impossível porque dentro de mim só existe morte. Espero o tempo fazer a sua parte.

Desde o último mosaico que fiz, antes da mudança, 5 meses já se passaram. Marco na agenda um dia para (re)começar. Garrafas são o meu lugar seguro. Então começo. Meu ritmo é lento e não tenho muita certeza do que estou fazendo, mas isso não importa. Fazer é o que importa. Vou me reconectando com minhas ferramentas,  com meus materiais e me conectando com o novo espaço que tenho agora.

Vivendo um dia por vez, fui dando vida à garrafa e, de certa forma, a mim mesma. Ficou pronta e senti satisfação. Um pingo de esperança também, apesar de estar brigada com este sentimento.

Parte da frente.

Detalhe da tampa.

Parte de trás.

Lateral

Cada acontecimento da vida, dos pequenos aos grandes, dos bons aos ruins, nos transforma de alguma maneira. Os mais marcantes fazem tudo mudar. Entender o novo cenário no qual passamos a existir é um grande desafio (pelo menos para mim) e requer tempo e paciência. A gente vive o que a gente tem para viver hoje e agora. A gente tenta. Não tenho a menor ideia do sentido disso tudo, se é que isso tudo tem sentido. Mas a gente segue porque é isso que tem para fazer.

Até a próxima.
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Heimweh

 Habitar um lugar com quatro estações envolve lidar com um certo nível constante de desespero. Pelo menos é assim que sinto. Não se pode fazer qualquer coisa a qualquer tempo porque o clima é quem dá as cartas. Isso significa, minha amiga, meu amigo, que ao primeiro sinal de temperaturas mais altas, o surto coletivo está decretado. Verão é o momento onde todos estão em todos os lugares fazendo tudo que conseguirem fazer. Então, após disputar a tapas e pontapés os dias de férias, rumamos para Eisenach.

Essa pequena cidade (pequena, mas três vezes maior do que Herrsching) no estado da Turíngia é destino de turismo local. Além de ser a cidade natal de Bach, é onde se encontra o Castelo de Wartburg, lugar no qual Martinho Lutero traduziu o Novo Testamento do latim para o alemão. Mas o motivo de nossa viagem não teve relação com música ou religião...pelo menos não essa. Eisenach abrigou a AWE - Automibilwerk Eisenach (1898-1991) - empresa que fabricou o carro Wartburg entre 1956 e 1991. Com a reunificação entre as Alemanhas, a produção foi descontinuada e a fábrica fechada. Está aí a origem do motivo desta viagem: ver um monte de carro velho, digo, antigo. Ver lindos e bem conservados carros antigos!

Existe lá um autoclube que se dedica a preservar a história daquele carro. A motivação deles é tal, que conseguiram em 2005 montar um museu dedicado aos carros produzidos pela AWE em um dos prédios da antiga fábrica. Além disso, promovem anualmente um encontro onde compartilham não somente a afinidade automobilística, mas também por um estilo de vida que se extinguiu com a reunificação das Alemanhas. O nome do autoclube e do encontro é "Heimweh". Esta palavra pode ser traduzida como saudade de casa, saudade da terra natal, nostalgia. Um significado que conheço profundamente.

Fomos ao tal encontro. Eu esperava ver centenas de Wartbrugs em todas as variações possíveis e de fato vi. Mas o que eu não esperava era ser recebida de forma tão generosa pelas pessoas do autoclub, em especial pelo seu fundador Enrico Martin. E aí, meus amores, fez aquele contraste colossal com a vida cotidiana. A gente vai se acostumando com algumas coisas que não são boas na mesma medida em que vai esquecendo de como a vida deveria/poderia ser. E vou te dizer: é muito bom sentir-se bem-vindo, ser acolhido, sentir-se parte...ainda que de forma passageira. Fiquei tão impactada com isso que quis retribuir de alguma forma. A forma que eu tenho, normalmente, é através do mosaico. Dentre as possibilidades, escolhi o nome do evento, a palavra que ecoa tanto em mim, nosso ponto em comum.

Do site do evento peguei o modelo para o mosaico.



E fiz esta placa para presentear o casal de anfitriões.

Para compor as bordas e as letras do mosaico usei pastilhas do tipo Cristal. Para o fundo, pastilhas de cerâmica que só a torquês Montolit dá conta de cortar. A disposição das tesselas, criando estas listras verticais, me levaram a uma viagem pelas memórias das estações de metrô de Berlim e suas cerâmicas tão características.

Saudade é essa coisa dúbia. É doída, pode causar tristeza, mas nasce de algo muito bom que ficou no passado. É ruim, mas é bom...é bom, mas é ruim. Independente de como a gente consiga se relacionar com ela, acho que o ponto pacífico é: não sentimos saudade do que foi ruim. Coisa ruim a gente deixa para o tempo sepultar. Ou fermenta no ódio, como no meu caso.

Até a próxima!
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