Olá!

Aqui você encontra vários tipos de textos com reflexões, introspecções, filosofadas e relatos, tudo sob a luz do mosaico. Desejo inspirar você com a mesma arte que me inspira.
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A tristeza, a garrafa e o recomeço.

Dia 15 de setembro de 2023 deixei a "vida-não vida" para trás. A ansiedade batendo recordes. Chegamos dia 16, todos vivos e a salvo. Alívio.

Dia 30 de setembro de 2023 um reencontro aguardado transformou-se em despedida. Nos meses seguintes tentei equilibrar a readaptação do retorno com a readaptação da vida com um afeto a menos e um vazio a mais.

Dia 30 de novembro de 2023 uma nova despedida. Brutal. Esmagadora. Perco o chão e a companhia mais fiel que já conheci. Não há respostas para minhas perguntas. Estou também eu morta. Morta e culpada.

Dia 03 de janeiro de 2024 meus olhos (e todos os meus sentidos) encontram a cena mais triste que já testemunhei. Choque. Trauma. A tristeza vira um poço muito profundo e nesse momento eu duvidei que conseguisse refazer a minha vida. Duvidei que fosse possível criar novamente. A vida virou um lugar terrível na expectativa do próximo luto. Medo constante de trilhar os conhecidos passos de um novo funeral. As perguntas sem respostas tecem um manto de desconsolo que arrasto pelo chão.

Num dia reúno a energia para tentar. Meu olhar, que só consegue se fixar bem abaixo da linha do horizonte, vê as garrafas na prateleira mais baixa. Passo a mão por várias até escolher uma. Não lembro onde estão os puxadores de gaveta. Tudo foi organizado por mim, mas ainda não estou ali. Por fim encontro-os. Escolho um. Mais alguns dias passam com a garrafa e o puxador sobre a mesa. Ainda parece impossível porque dentro de mim só existe morte. Espero o tempo fazer a sua parte.

Desde o último mosaico que fiz, antes da mudança, 5 meses já se passaram. Marco na agenda um dia para (re)começar. Garrafas são o meu lugar seguro. Então começo. Meu ritmo é lento e não tenho muita certeza do que estou fazendo, mas isso não importa. Fazer é o que importa. Vou me reconectando com minhas ferramentas,  com meus materiais e me conectando com o novo espaço que tenho agora.

Vivendo um dia por vez, fui dando vida à garrafa e, de certa forma, a mim mesma. Ficou pronta e senti satisfação. Um pingo de esperança também, apesar de estar brigada com este sentimento.

Parte da frente.

Detalhe da tampa.

Parte de trás.

Lateral

Cada acontecimento da vida, dos pequenos aos grandes, dos bons aos ruins, nos transforma de alguma maneira. Os mais marcantes fazem tudo mudar. Entender o novo cenário no qual passamos a existir é um grande desafio (pelo menos para mim) e requer tempo e paciência. A gente vive o que a gente tem para viver hoje e agora. A gente tenta. Não tenho a menor ideia do sentido disso tudo, se é que isso tudo tem sentido. Mas a gente segue porque é isso que tem para fazer.

Até a próxima.
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O olho que olha

 As famosas placas de ferro do Sr.Walter foram base para muitos dos meus trabalhos ao longo dos anos. Bateu uma saudade daquela época, das visitas periódicas para comprar mais placas e da acolhida que sempre recebi na casa deles (a D. Marta, esposa do Sr.Walter, é parceira de primeira linha nos negócios). Sempre havia papo, contação de história e visita à horta. Sempre havia uma caixa de legumes e verduras para eu levar junto com a encomenda de placas. Na verdade eu queria reviver aqueles tempos, quando em mim havia ainda um pequenino reduto de inocência que se extinguiu nos anos que vieram.

A saída para este tipo de banzo foi fuçar a prateleira dos materiais. Minha mémória dizia que em um dos nossos reencontros eu tinha voltado com umas duas placas na mala. Era isso mesmo. Achei-as ainda com a embalagem de espuma. O formato elíptico e os arabescos me fizeram revisitar toda a dinastia de Olhos Gregos que já fiz. Eu os adoro. Não sei porque. Apenas adoro. Mas não queria fazer um amuleto. Então fiz apenas um olho com stained glass, outros tipos de vidro e dois pinguinhos de espelho.


Terminei e vi este olhar vago, um tanto sem vida. Parece que não julga, parece que sequer presta atenção no que está a sua volta. Apenas olha, absorto em outros mundos. Está cansado, exausto, insone. Entrega-se ao olhar do observador sem fazer muita questão de interação. Ainda assim, sustenta o olhar, não se desvia, não foge, permanece.

Uma vez pendurado, olho-o de vez em quando. Se paro e ponho reparo, começo a pensar nos olhares que não são de vidro. Quanta coisa cabe ali! Um universo de palavras não ditas ganham o mundo jorradas pupila afora. E aí não tem como ocultar o que vai na alma, na cabeça, no coração, na índole. Impossível. A boca falando e olhar desmentindo ou confirmando. Que riqueza há nisso, não é?

A parede de mosaicos ganhou mais um item e o meu banzo não foi exatamente solucionado. Faz parte. Uma coisa me consola: enquanto o passado acontecia, eu sabia quando estava bom. Prestava atenção, curtia e agradecia. 



A gente se vê na próxima.

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Vizinhança, vasos e apego.

 O diagrama é o seguinte: a vizinha, que agora é vizinha minha, tem uma vizinha de quando não era vizinha minha. Passada a fase de reclusão da pandemia a ex-vizinha da agora vizinha minha decidiu festejar o próprio aniversário em grande estilo. Comemorações especiais pedem presentes especiais, certo? Foi então que a vizinha, a minha, me pediu para fazer um presente para a vizinha, que um dia foi dela (parece que uma vez vizinha, sempre vizinha).

Ponderamos juntas o que caberia para a ocasião. Algo marcante, que pudesse estar sempre em uso, ser sempre visto. Então decidimos por um par de lâmpadas-vaso, onde a lâmpada maior media 14 cm de altura e menor, 11cm. Para o estilo me foi dada carta branca. Isso seria a certeza de que o resultado teria um aspecto completamente diverso da estética local, afinal, para que servem os amigos estrangeiros senão para apresentar lampejos de um outro mundo?

Abri a porta de um universo onírico só meu e dali peguei o que precisava. Durante o trabalho fui contemplando meus desejos, cada vez mais, e um apego foi surgindo ali. Um desejo de posse ou de proteção, não sei. Fato é que quando os dois pequenos vasos ficaram prontos fiquei com muita pena de deixá-los ir, pena de irem para um local onde não fossem totalmente compreendidos. Cogitei recusar pagamento e pagar para não entregar. Pareceu racionalmente absurdo, ainda que emocionalmente plausível. Acabei por cumprir o combinado, ficando com a consciência tranquila e o coração ruído. Esta dor vem da percepção que tenho de que eu e os teutões da região que hora habito, temos sensos estéticos diametralmente diferentes. Isto significa que a pessoa presenteada jamais, nem vivendo mil anos, verá ali o mesmo que eu vejo. E isso me parece um desperdício sem propósito. Mas...isso não é problema de ninguém, a não ser meu. Eu que resolva minhas dores na terapia.

Esta é a lâmpada-vaso maior.

A parte lateral.

A parte de baixo.

A lâmpada-vaso menor.

A parte de trás.

A parte de baixo.

A transação foi realizada conforme o combinado. A vizinha, que agora é minha, gostou do que comprou. Resolvi pensar que isto basta e não perguntei se a ex-vizinha, a que foi presenteada, ficou feliz com o presente. Se a resposta fosse negativa, eu sofreria e teria vontade de ir até ela resgatar os vasinhos. Se a resposta fosse positiva, seria insuficiente para diminuir o abismo colossal que abrange nossas visões de mundo.

É...parece que apego e sofrimento caminham lado a lado.

Até a próxima!


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A Dominação Mundial Felina, a serra tico-tico e o auto censor.

 Depois de concluir a "Garrafa da Reabilitação" coloquei novamente o mosaico em pausa para aprender outras coisas, continuar treinando crochê e desenhar (meu ansiolítico preferido). Fiz um curso online de Ponto Bargello e enquanto contemplava o desastre que ficou meu projeto do curso o portal cósmico do mosaico abriu-se novamente. O pedido veio da minha parceirona de escatologia, da melhor professora de crochê que eu poderia ter, da mulher que conheci aqui, mas que descobri que fomos praticamente vizinhas na década de 1990 em São Bernardo do Campo, da pessoa que dá um "Foda-se" como ninguém. Ela pediu um gato para presentear o sobrinho gateiro. Eu, como serva felina que sou, senti-me honrada. A imagem de referência era essa aqui:

Um aparador de porta visto no Instagran.



No nosso caso, o gato seria para enfeitar uma prateleira. Para receber mosaico, achei que outras silhuetas seriam mais adequadas. E a amigona escolheu esta:


Hora de botar a mão na massa. Para cortar esse perfil usei a dupla serra tico-tico e bancada. Foi a primeira vez que utilizei a bancada e, menina!, que delícia! O corte corre pelas linhas curvas como música suave. Senti tanto poder que me deu vontade de sair por aí resolvendo os problemas do mundo com a bancada e a serra embaixo do braço. Infelizmente a mesma alegria não se repetiu na hora de limpar o pó fino acumulado por to-da-par-te...

Superadas as dualidades da vida, comecei o revestimento da silhueta. Usei vários tipos de pastilhas, sendo alguma de cerâmica e outras tantas de vidro, misturando texturas e cores. Para o rejunte, escolhi o cinza grafite. Mosaico concluído, usei retalhos do corte da madeira para fazer a fazer a base e colocar o gatinho em pé. A madeira pintei de cinza médio.

Fofo? Muito fofo!


Sem dúvida foi especialmente gostoso mosaicar o símbolo máximo da elegância, da inteligência e da sabedoria. É dever nosso, toscos mortais, prestar honras e glórias àqueles que salvarão e comandarão o planeta.

Brincadeiras (ou não...à parte), sabe o que foi o melhor de fazer esse gatos? Foi ter um diálogo mais amigável com aquela voz interior que adora cortar o meu barato. Ela surge em vários momentos dos meus dias e sempre fala algo muito cruel como "você acha que isso está bom? Essa porcaria de corte está bom para você? Você não tem vergonha de cobrar por uma porcaria dessa?". Credo, não é? Passei muito tempo evitando essa voz. Mas parece que quanto mais eu tentava ignorá-la, mais forte ela ficava. Então aprendi com a D. Psicóloga que é preciso parar, escutar o que ela tem a dizer e questionar - eu acredito mesmo que está uma porcaria? No caso minha resposta foi não. Aí é hora de dialogar com a voz, algo mais ou menos assim: "eu ouvi o que você disse, mas não concordo com isso. Fiz este mosaico com cuidado, com capricho, prestando atenção aos detalhes. Agora me dê licença porque vou continuar meu trabalho". É mais ou menos um "ahã...senta lá, Cláudia". Isso tudo pode soar meio estranho se você nunca ouviu uma voz como essa. Mas se você também tem um auto censor na sua cabeça, entende como colocá-lo no devido lugar é importante. Não se trata de extinguí-lo, mas de mantê-lo do tamanho adequado para que a gente possa desfrutar dos nossos momentos com leveza.

Finalizado, o gatinho mede 25 cm de altura e 20 cm de largura.

Fiquem bem, meus queridos! Façam as pazes consigo mesmos e até a próxima!

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A recuperação, a paciência e a garrafa.

20 minutos. Esse era o tempo que eu conseguia fazer um pouco de mosaico antes de ceder à dor. Ao contrário do que imaginava, o mais dolorido não era usar a torquês, mas fazer movimentos mais finos com os dedos, como segurar a pinça ou pegar uma miçanga. A postura também era um problema. O colar cervical diminuía a dor, mas dificultava todo o resto. Destino dado, o melhor que eu poderia fazer era aproveitar esses 20 minutos diários. Lado ruim: quando começo um trabalho, quero ir fazendo até cansar, até dar a hora de fazer outra coisa ou até acabar a inspiração. Era frustrante. Mas fazer nada seria incomparavelmente mais frustrante ainda. Lado bom: o ritmo bem lento foi um convite para mergulhar nos detalhes. Além disso, de um dia para o outro o silicone estava bem seco e isso me dava total liberdade para trabalhar qualquer face da garrafa que quisesse, sem medo de deslocar alguma tessela. Foi sob essas regras que comecei o novo trabalho.

Para este, deixei um pouco de lado o tipo de tampa que normalmente uso - o puxador de gaveta fixado numa rolha. Fui até a última prateleira da estante resgatar uma tampa de vidro comprada num passado já sem data. Nesta garrafa a tampa não ficaria fixa como em todas as antecessoras. Fiquei imaginando que deliciosa extravagância seria tomar qualquer coisa que saísse de uma garrafa completamente revestida em mosaico e cedi à sedução da idéia. Na prática não tenho coragem de fazer isso. Imagina colocar um suco ali dentro. Como seria para limpar depois? Como saberia se a garrafa ficou realmente limpa? Não, não, não! No mundo real não daria certo. Mas na imaginação é incrível! Segui com meu plano.

Não é uma lindeza de tampa?

Como de costume, as cores da tampa determinaram as cores dos materiais para o mosaico. Depois disso, o trabalho de formiguinha correu, ou melhor, andou solto, bem solto mesmo. Um espacinho a cada dia. Um dia em cima, no outro embaixo. Formar linhas, preencher formas, criar e repetir padrões.
Houve momentos em que achei que não terminaria nunca. Precisava me lembrar constantemente que o mais importante era fazer. Terminar seria uma consequência. Era (e ainda é) fundamental manter os músculos em movimento. Aprendi com a fisioterapeuta que é justamento o movimento que nos tira de uma crise. Aprendi ainda que os exercícios devem ser feitos não apenas depois, mas também antes do trabalho.

E, de 20 em 20 minutos, a garrafa ficou pronta. Ao final, o limite dos 20 minutos já era 30, às vezes 40 minutos. Só uma coisa não mudou: o dilema da cor do rejunte. Optei por cinza, mas fiz uma mistura de dois tons que já tinha para ficar num meio termo. Gostei? Gostei. Fiquei pensando se o preto não ficaria melhor? Fiquei...só para não perder o costume.


A parte da frente. Dá um close e vê essa riqueza em detalhes.

A garrafa de perfil. Algo aí me faz pensar em céu, em nuvens, em conforto.

A parte de trás que também poderia ser da frente.

Fiquei com vontade de ter uma base giratória para contemplar em modo contínuo todos os lados da garrafa e me perguntei que história é essa de ter uma parte que fica para frente e outra que fica para trás. Talvez não precise ser sempre assim. Já fiz algumas garrafas que não tem frente ou trás porque todas as faces são iguais. Não é o caso dessa.

Além de pensar sobre lados, também pensei de onde vem a pressa, a urgência que sentimos constantemente. Por que mesmo precisamos correr? O que exatamente tem nos roubado os inestimáveis momentos presentes? Eu sempre tive pressa de terminar um trabalho para poder começar outro. Nessa garrafa não adiantava a pressa. O ritmo foi estabelecido pela dor e na lentidão da minha possibilidade eu pude estar mais no presente, pude desfrutar mais profundamente daquilo que me encanta. Talvez porque soubesse que aquele momento era breve. Talvez porque fosse impossível agir diferente. Seja o que for, me pareceu que vivemos um tanto errados há um tanto de tempo. Esse não é um pensamento do tipo "joga tudo fora e começa de novo". É um pensamento do tipo que quer prestar mais atenção naquilo que traz angústia e ansiedade e então refletir se não há uma outra maneira de fazer o que temos que fazer. Uma maneira que nos permita não apenas um maior desfrute do momento presente, mas o desfrute de nós mesmos, menos apartados de nosso íntimo.

E nas tentativas, seguimos.

Até a próxima!
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O Vaso restaurado.

Este vaso foi feito em 2016, ou seja, ontem (clique AQUI para ler sobre o nascimento dele). Foi o primeiro que fiz usando tampinhas de garrafa. Na ocasião, achei que fazia muito sentido amassá-las para depois colá-as ao vaso. Hoje, honestamente, não acho que esse seja o melhor caminho...

O vaso com tampinhas na ocasião de seu nascimento.

O que deu errado não foi amassar as tampinhas, mas não ter retirado aquela borrachinha que vem grudada na parte de dentro. Ledo engano. O adesivo aderiu à borracha e não à tampinha. Com o passar dos anos o óbvio aconteceu: uma tampinha se soltou. Por motivo de preguiça pura tentei dar o truque e apenas recolar a tampinha, desta vez sem a borracha. Tarde demais. O rejunte já havia rachado e o reparo durou pouco tempo. Começou então um tipo de efeito cascata. A cada vez que eu mexia no vaso o mosaico da borda ia ficando mais frágil. Até aí eu me contentava em virar o lado quebrado para a parede e seguir o baile. Então descobri que há algo que me afeta mais do que um mosaico capenga - planta triste.

Originalmente o vaso foi feito para abrigar um pé de gengibre. Depois de um tempo o gengibre ganhou a companhia da cúrcuma. Aí achei que a dupla tinha morrido e plantei ali a Ciclame, a fim de salvá-la de depressão de uma vaso minúsculo. A Ciclame foi muito bem. Cresceu e deu flor...até que o gengibre e a cúrcuma reapareceram. Eu, na minha inocência botânica, desconhecia a motivação dos rizomas. O gengibre e a cúrcuma não tinham morrido, apenas estavam numa espécie de entressafra. O problemas é que as três plantas têm necessidades distintas de rega. Resultado: a Ciclame voltou a deprimir-se. Então tirei-a deste vaso para um outro novo, que não abrigasse nenhuma surpresa oculta e continuei conformada em apenas esconder a parte estragada do vaso. Mas aí, não sei se foi efeito da terapia ou o famoso fogo no rabo, achei que isso era uma pouca vergonha. Lá fui eu tirar a cúrcuma e o gengibre da terra, colocá-los na água e restaurar o vaso. Esse tal restauro, meus anjos, durou alguns meses. Sempre surgia alguma coisa que parecia mais importante. Os rizomas (agora eu já estava íntima deles) estavam bem na água, criando novas raízes, de forma que isso contribuía para minha falta de urgência com o vaso. Meu único avanço na obra havia sido remover o que estava e o que não estava solto na borda.


Contudo, esta que agora aqui se confessa, começou a respirar outros ares. Comecei a aprender crochê. Isto me deu uma empolgação para atender outros desejos antigos e me increvi num curso online de Upcycling de Roupas. Fui fazendo as aulas, os exercícios e chegou a hora de fazer o projeto de final de curso. Aí voltamos para o vaso, coitado, emborcado sobre a mesa. Mesa essa da qual precisarei de cada centímetro.

Com motivos mais do que abundantes fui finalmente para a restauração. Refiz o mosaico da borda numa diposição um pouco diferente da original e cobri toda a borda com tampinhas douradas. Hava Nagila!!!




Quantos às plantas, é com pesar que comunico o falecimento do gengibre. Fui tirar uma folha seca e quebrei o caule numa fratura mortal. Como sobrou apenas a cúrcuma, cedi a vez no vaso restaurado para a Flor de Maio. Sempre leal e sintonizada, ela nunca deixou de florir, nem mesmo este ano quando já dava sinais de cansaço pela falta de espaço no pequeno vaso onde residia. Agora ela está no vaso das tampinhas devidamente restaurado, a cúrcuma está no vasinho que era da flor de maio e eu finalmente tenho a mesa livre para fazer meu projeto de Upcycling.


É, colegas, o "x" da questão é descobrir o estímulo que funciona para a gente.

Até a próxima!

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O carro, a bandeja e a pequenez do mundo.

Você já ouviu o ditado que diz que o mundo todo tem 300 pessoas e o resto é figurante? Isso explicaria porque de quando em quando esbarramos com alguém que conhece alguém que nos conhece. Daí a necessidade de andar direito na vida ou assumir o risco de ter sua reputação jogada na lama. É basicamente isso que me impede de sair de pijama sob o casaco para dar aquela corridinha na farmácia. Pois bem, sabendo que somos este punhadinho de gente no planeta, era de se esperar (mas na verdade, não) que alguém que estivesse em Herrsching quisesse conhecer o meu trabalho. Não qualquer alguém, mas alguém que já sabia que eu faço mosaico porque conhece a minha mãe e, por meio dela, já havia visto fotos dos meus trabalhos no Facebook. Como se não fosse cruzamento suficiente de destinos, a futura cliente estava passando ums dias na casa de uma amiga aqui na cidade, mais especificamente a dois quarteirões de onde moramos. Foi assim que nos encontramos.

O pedido era um presente de casamento. Tendo o casal a vida já estabelecida, precisaríamos pensar em algo muito personalizado. Pensando em gostos, na casa e tudo mais, decidiu-se por uma bandeja com a figura do carro Hummer, uma paixão do noivo. Outro detalhe importante era a cor, preferida do casal para tudo na vida: preto. Não só a cor do carro, mas da peça toda.
Com tudo definido, bora trabalhar! O material escolhido foi o Smalti italiano. Como a bandeja é uma peça utilitária, houve a necessidade de colocar uma placa de vidro sobre o mosaico. Para tanto coloquei 12 pedacinhos de madeira distribuídos pelas as bordas e peloo meio da superfície da bandeja para servirem de apoio para o vidro. 
Além do preto, usei também o tom mais ecuro de marrom e o tom mais escuro de cinza. Alguns outros tons de cinza para detalhes e nuances e ouro branco para o contorno
Este pedido me tirou por bons momentos do calor egóico onde cada tessela é sobre mim e relembrou a delicadeza que é fazer um mosaico sobre o momento de outra pessoa, com outro olhar e outro querer. Um pedido nascido do afeto para celebrar o afeto.
Acima você vê abandeja prontinha e brilhando. A seguir, o vidro foi colocado.
Um viva aos noivos! Que a união prossiga, longeva, saudável, vibrante e afetuosa.

Um viva aos caminhos que se cruzam, nunca ao acaso, e ao que surge destas intersecções!

Até a próxima!
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O espelho, as miçangas e o frangalho emocional.

 Aqui na sala onde fica minha mesa, comecei a compor uma parede com os meus trabalhos. No começo a questão era apenas encontrar uma maneira agradável de dispor os mosaicos que iam nascendo. Mas, a partir de um momento, os mosaicos começaram a nascer para integrarem essa composição. Com a ordem das coisas invertida, estava na minha mira um trabalho que abrigasse um espelho redondo e que preencheria o último grande espaço vago. Já sabia que o espelho seria disposto no canto superior direito de uma base retangular. Assim, esta peça faria o contraponto com o outro mosaico com espelho que habita a parede.

Com a base montada, precisava de um ponto de partida. Já havia decidido que algum conteúdo do pote de sucatas deveria fazer parte deste mosaico. O motivo? Precisava esvaziar um pouco o tal pote. De lá tirei moedas, uma arruela, um filtro antigo de cafeteira italiana e um zíper. A ideia inicial foi essa:

 


Achei que era um bom começo. O passo seguinte foi pintar estas peças e adicionar detalhes. No momento de colar decidi por não colocar o zíper e o visual foi este:

Sobre o filtro da cafeteira, colei canutilhos e um broche. Sobre a arruela, canutilhos e contas de vidro. Nas moedas, mais canutilhos.

Deste momento em diante trabalhei das bordas para dentro. Meu desejo maior foi ter todo o tempo do mundo para fazer tantos detalhes quantos fossem surgindo na mente. A cada nova fase, um novo humor. Os diferentes estados de espírito ficaram encravados na argamassa. Teve tudo, tudo o que você pode imaginar que seja possível sentir no mundo que temos hoje.

Teve desejo de acolhimento, de comunhão, de dias com mais brilho no olhar.

 
Teve o momento de querer estar na natureza, aprendendo sobre nós através dela.

Teve desejo de ir além de nossas barreiras físicas, ser mais etérea, mais inteligente, compreender o todo.


Teve a angústia roubando o ar. Teve o esforço para respirar...devagar, com ritmo e consciência. Tentativa de pensar melhor.

Teve momento de não querer pensar e, principalmente, não querer sentir, com medo de que o coração não aguentasse.

Teve o momento de perceber que o fundo do poço tem porão e de buscar ajuda para tentar tirar o mastodonte que está sentado há séculos sobre o meu peito.

Teve tentativa de se reorganizar, entendendo que essa tentativa tem que ser repetida todos os dias.

Teve apoio e acolhimento das amigas. Nos escoramos umas nas outras, porque não está fácil...por meio de uma delas veio a indicação do poema tão preciso. Empatia.

Ao concluir o mosaico, entendi que ele foi feito não pela junção de vidro, metal, madeira, cimento...ele foi feito com o amálgama deste emaranhado de emoções agudas e mal endereçadas que estão em mim. Uma mistura de extremos opostos, de conflitos, de antônimos. Ele me denuncia sem nenhum constrangimento.

Ao contemplá-lo, me vejo. Os últimos meses foram ruidosos dentro da cabeça. Aversão. Compreensão.

É isso o que acontece quando a gente resolve criar, não importa o que esteja acontecendo: nos revelamos cruamente para nós mesmos.

A parede recebeu mais uma peça do quebra-cabeça. Mais um retrato colorido de um momento específico.

Ainda há outros espaços a preencher. Novos capítulos de uma velha história.


Sigamos, colegas, sigamos...

Pausando. Respirando. Respeitando. Ajudando. Sendo ajudado.

Cuidem-se bem para que possamos nos encontrar na próxima. Até lá!

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Charles de Gaulle, a ansiedade e o mosaico.

 O episódio Charles de Gaulle

A hoje vizinha havia se mudado há pouco tempo para a região e ainda morava em um hotel enquanto procurava apartamento para alugar. Conta ela que, certo dia, enquanto dava aquela boa relaxada no esqueleto, alguém abriu a porta do quarto. Tomada por um susto sem tamanho, ela levantou prontamente da cama já perguntando "quem é?". Não deu tempo de ver as feições do invasor, que saiu em disparada dizendo "Charles de Gaulle! Charles de Gaulle! Charles de Gaulle!". Minutos depois o telefone do quarto toca. É a recepção pedindo milhões de desculpas. Houve um equívoco nas reservas e a chave do quarto ocupado pela hoje vizinha foi dada a um novo hóspede. Para tornar a desculpa mais crível, o hotel ofertou à hóspede invadida uma garrafa de espumante de primeiríssima qualidade. Achei justo.

Quando ela nos contou o ocorrido, supusemos que o invasor não teria dito "Charles de Gaulle", mas sim "Entschuldigung!", que signifa "desculpa" em alemão. A hoje vizinha fez uma carinha de que finalmente as coisas faziam mais sentido. Brindamos, nos deliciamos e eu pedi se poderia ficar com a garrafa, tão ancuda e pescoçuda. Pedido atendido, a garrafa foi para a prateleira dos materiais.

A ansiedade e o mosaico.

Atualmente deixo para fazer uma garrafa quando quero colocar as coisas de dentro da cabeça em ordem. 

Ano novo, problemas velhos, achei que uma garrafa seria a melhor forma de começar janeiro. Olhei a prateleira e escolhi justamente a garrafa "Charles de Gaulle". Suas formas marcantes seriam um bom estímulo. Porém, desta vez, não queria que a já companheira íntima, a ansiedade, atrapalhasse a minha brincadeira. Propus uma regra para mim: não faria nada correndo. Levaria o tempo que fosse preciso para fazer o mosaico. Se desse um branco, faria uma pausa e só seguiria adiante quando surgisse a ideia. Fiquei muito vigilante e parei o trabalho inúmeras vezes. Fazendo isso, descobri que a ansiedade em terminar logo vem do fato de que há muitas ideias na cabeça e a torneira por onde elas saem tem uma vazão muito pequena. Então fica aquela pressão desgraçada, um desejo de tornar real tudo o que habita a imaginação. Impossível, não é, amores? Totalmente impossível.

O fato é que fazendo as pausas necessárias para não colocar a carroça na frente dos bois, levei quase um mês para terminar o mosaico. Um mês! Qual o ponto positivo? Tenho apenas um arrependimento no trabalho como um todo: a cor do rejunte. Normalmente são vários arrependimentos. O ponto negativo é que levou um mês para fazer um trabalho de aparência ordinária, ou seja, não é pior e nem melhor do que os demais. Então concluí algo bem estranho: talvez não valha muito a pena querer controlar a ansiedade a ferro e fogo. Quero dizer, o fato de eu deixar para continuar o trabalho quando estivesse mais tranquila e pensando com mais clareza não me levou a um resultado melhor. Se tiver algum analista lendo isso, por gentileza, me conte o que Freud diria.

Enquanto aguardo o meu diagnóstico, vamos aos fatos:

Ei-la, senhoras e senhores,a rainha de janeiro!

O bom e velho puxador rosqueado na rolha como tampa. Agora desça um pouco o seu olhar e veja que belo desenho as miçangas formaram ali em baixo.


Cada coluna da garrafa teve uma cor guia. Foram quatro no total: laranja, rosa, roxo e verde.

Usei conchas pintadas por toda a volta.

Para o mosaico desta garrafa usei pastilhas de vidro, miçangas, contas, canutilhos e conchas. A questão do rejunte é que se ele fosse uma tonalidade mais escura, acredito que as cores ficariam mais vibrantes. Da forma como ficou, a garrafa tem uma delicadeza que eu não desejei que tivesse. Mas, como alguém já disse em vários lugares, tudo é aprendizado. Por aqui, lição aprendida e anotada.

Espero que o ano de vocês, até este meio de fevereiro, tenha sido estável. Se não melhorou nada em relação ao nefasto 2020, que pelo menos não tenha piorado. Torço por isso!

Até a próxima!

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A Prateleira para o Dragão Fumeta.

Aconteceu novamente. Baltazar empolgou-se em meio aos anúncios dos classificados de desapego e em uma semana mais dois rádios antigos vieram habitar este pequeno lar. Tira coisa daqui e põe para lá, espreme de uma lado, espreme do outro e os novos integrantes da família encontraram lugar nas prateleiras. Contudo, pelo princípio da impenetrabilidade, o meu querido Dragão Fumeta ficou sem teto. Antes que você se pergunte, o Dragão Fumeta é um simpático queimador de incensos, no formato de um pequeno dragão que expele a fumaça pelas suas narinas, ou seja, a coisa mais fofa desse mundo.

A fim de evitar que o coitado fosse para dentro de algum armário entulhado e, consequentemente, esquecido, a solução foi criar uma prateleira especialmente para ele, a ser apoiada entre as pernas de um banco alto, que faz a vias de mesa de canto.

Para a base usei um pedaço de compensado e para os mosaico decidi que usaria restos de corte de pastilhas e de azulejos, além de alguns materiais que tenho há seculos e nunca uso. Delimitei no centro da placa o lugar para o dragão e ali apliquei os restos de cortes de pastilhas. Tudo foi contornado com pastilhas cristal com estampa que nunca tinha usado. O espaço que sobrou foi revestido com os restos de cortes de azulejos.


As pastilhas redondas também estavam esquecidas entre os materiais e encontraram aqui o seu momento de brilhar.




Para o acabamento das bordas da placa, cortei rolhas de garrafa em quatro partes no sentido do comprimento e, depois de coladas, passei duas demãos de verniz. Desta forma a cor ficou bem próxima da cor da madeira do banco, onde a prateleira foi encaixada. Para este encaixe acontecer, foi necessário deixar ser borda de rolha o espaço referente à largura das pernas do banco.


Escolhi o rejunte da cor cinza claro para adicionar menos informação visual à prateleira, uma vez que os restos de corte já são algo do tipo "tudo ao mesmo tempo agora".

 

Prateleira pronta, o amado Dragão Fumeta foi para sua casa nova e esse canto da sala ficou mais alegre. Faz parte do meu projeto "cor é o que não falta aqui" ou "cor: quanto mais, melhor".


Depois de fazer isso comecei a olhar as cadeiras da casa sob uma outra perspectiva, considerando a possibilidade de elas também ganharem prateleiras que podem acomodar livros e revistas, por exemplo...ou uma manta dobrada...onde certamente um gato iria se acomodar para seu sono reparador. É, colegas, a falta de espaço também serve de adubo para a criatividade.

Ainda que sobre a mesa de trabalho exista neste momento uma garrafa me esperando, a prateleira foi o último trabalho deste ano. Agora chegou aquela hora na qual a gente faz uma pausa para olhar para trás e para dentro. Que ano, hein? Eu sou incapaz de concluir qualquer coisa agora. As emoções tem estado tal qual um mar revolto. Quando chegar a calmaria - e um dia ela há de chegar - poderei tentar entender alguma coisa sobre o que vimos, vivemos e sentimos neste fatídico 2020. O único ponto que é claro para mim é que o mosaico foi o meu colete salva-vidas durante a tormenta que tem nos assolado. Foi um lugar seguro que pude acessar várias vezes, onde puder ser livre e ter esperança.

A todos que me fazem companhia aqui, recebam meu agradecimento profundo! Essa troca que temos significa muito para mim, é um farol que me guia na escuridão. Desejo que cada um de vocês também tenha seu "porto seguro" para se refugiar sempre que o mistério da existência esmagar o seu coração.

Fiquem bem, sejam responsáveis e até a próxima, a bordo de um novo calendário.

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