Olá!

Aqui você encontra vários tipos de textos com reflexões, introspecções, filosofadas e relatos, tudo sob a luz do mosaico. Desejo inspirar você com a mesma arte que me inspira.

A bandeja e a Família Raposa.

 Foi pela lembrança da rede social que a amiga de Berlim viu a foto da badeja de outra amiga em comum. "Quero uma igual a essa. Você faz?"

A bandeja em questão era essa aqui...


Fiz esta peça em 2014 e as flores foram feitas com azulejos que peguei de uma caçamba de entulhos. Portanto minha resposta foi não. Não há como fazer uma bandeja igual a essa. Posso fazer uma muito semelhante, mas igual não tem como, já que não há maneira de ter o mesmo material. E eu ainda disse a frase que sempre ecoa no vazio: "Inclusive eu posso fazer qualquer mosaico que você quiser, podemos usar algum pequeno objeto que lhe tenha um significado especial ou algo assim". Eu prometi que esta foi a última vez que falei isso porque, em 98% das vezes, recebo a resposta "faz como você achar melhor". Não, galera! Se a bandeja for para mim, não tenha dúvida de que eu vou fazer como achar melhor. Mas se é para você e você vai pagar por isso, a bandeja tem que ser do jeito que você achar melhor. Cabe a mim ajustar o seu desejo à técnica e à função do objeto.

Enquanto eu deixo fixado no topo do meu feed mental uma outra forma de agir numa próxima ocasião, fico imaginando porque é tão difícil para as pessoas fazer uma escolha ou então contarem sobre suas preferências. Será que isso é uma liberdade muito fora dos seus costumes? Será que elas têm medo de me ofender de alguma maneira? Quanto mais livre, mais difícil fazer uma escolha?

Enquanto tentava (tento) entender um pouco mais sobre nossa mente, fui fazer alguns esboços para oferecer opções concretas e diminuir, quem sabe, a angústia da escolha. Foram três opções: um desenho floral, bem semelhante à bandeja da foto, um desenho com quatro Triquetas - um síbolo muito usado na Irlanda (país natal dessa amiga) - e o terceiro desenho com uma raposa geométrica. A última opção foi a escolhida...e não por acaso. O sobrenome da família é "Fuchs" que significa "raposa" em alemão. Eu escolhi as cores para não submeter a amiga a mais uma angústia. Sei que ela não gosta de coisas ultra coloridas, ainda que aprecie um toque do cor, e o inverno é a sua estação do ano favorita.

Tudo pronto para começar? Não, ainda não...faltava só chegar a bandeja em si, que ela fez questão de comprar de uma loja da qual gosta muito. 

Algumas semanas depois...


...chegou esta bela bandeja. E foi com imensa dor no coração que eu fiz isso...


Removi o máximo possível da pintura para iniciar o mosaico. Ainda enxugando as lágrimas por desfazer um trabalho que já havia sido feito, transferi o desenho e comecei o mosaico. Escolhi fazê-lo todo com cerâmica. A bandeja não era muito funda, então se eu usasse materiais diversos, com espessuras diferentes, não haveria altura suficiente para  nivelar as tesselas ou colocar um vidro sobre o mosaico. Com a cerâmica eu teria a garantia de uma superfície plana, necessária para uma bandeja.


Neste ponto a raposa e as bordas estavam completas, faltando apenas preencher o fundo. Para ele escolhi o azul mais claro que encontrei entre as opções de azulejo. Havia considerado fazer o fundo em verde, mas achei que azul está mais ligado a inverno do que o verde, além de ser a cor dos olhos dos quatro membros da família. Então assim fiz.


Fundo preenchido e mosaico rejuntado. Tudo plano como o planejado.


Bandeja pronta, envio a foto. Ela fica satisfeita com o que vê e diz que as crianças vão adorar, ainda que ela pretenda não permitir que cheguem perto. Não! Não! Não, amiga! Se as crianças quiserem, por favor, deixe-as tocar o mosaico, sentir com suas mãozinhas a textura e a temperatura, deixe que elas se encantem, que elas fiquem curiosas sobre o material, que elas se divirtam..."pode?" Pode! E então recebo esta foto que iluminou os dias escuros desta época...


Ooooooowwwwwnnnnnn...💙💙💙💙💙💙💙💙💙!!!!!!!!!!!

E deste belo trabalho guardei comigo que ter que fazer uma escolha pode ser tão angustiante quanto não ter escolha alguma. Aliás, ousaria dizer que há quem se sinta confortável em não ter que optar por nada, em simplesmente lidar com as opções que alguém já fez em seu lugar, mas que sentiria uma ansiedade sem tamanho ao precisar fazer uma escolha. Será que a dificuldade está, na verdade, em encarar as consequências decorrentes da opção que fez?

É, minhas queridas pessoas, somos um oceano de complexidades.

Até a próxima!
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